O ano de 1884: fazer pensar e agitar
Nesse tempo, Guimarães era habitada por uma plêiade de homens ímpares, daqueles que deram os seus nomes às ruas da cidade e cujas obras, nem sempre suficientemente lembradas, deveriam ser um exemplo para as novas gerações.
De entre todos, sobressaía Francisco Martins Sarmento, arqueólogo de pergaminhos já firmados nos meios científicos nacionais e internacionais, o homem sábio e solidário que a cidade admirava e escutava. Em sua homenagem, tinha sido criada, um par de anos antes, uma instituição que cedo se tornaria numa poderosa alavanca do progresso cultural, mas também social e económico, de Guimarães, a Sociedade Martins Sarmento.
Alberto Sampaio, José Sampaio, o Padre António José Ferreira Caldas, Domingos Leite Castro, o Conde de Margaride, Avelino Germano, Avelino da Silva Guimarães, Adolfo Salazar, Joaquim José de Meira, o Padre Oliveira Guimarães, futuro Abade de Tagilde, e tantos outros, faziam parte dessa geração que, irmanada das mesmas preocupações de filantropia e de abertura ao progresso, contribuiria para o arranque de Guimarães rumo aos tempos modernos.
Por essa altura, a Sociedade Martins Sarmento estava mergulhada em projectos ambiciosos que a iria transformar numa das mais prestigiadas instituições culturais portuguesas: a criação de cursos de formação profissional, a instalação da sua Biblioteca Pública, a fundação do Museu Arqueológico, o lançamento de uma publicação periódica que contribuiria para a elevação cultural de Guimarães e dos vimaranenses e para que Guimarães passasse a projectar para o exterior uma imagem de cidade de progresso e de modernidade.
Em meados de Fevereiro de 1884, começou a ser distribuído o primeiro fascículo da publicação que a SMS anunciara algum tempo antes, a Revista de Guimarães, em cuja introdução os fundadores da Sociedade traçaram “o desenho ambicioso de suas vastas esperanças” e inscreveram um voto: “concorrer poderosamente para uma melhor orientação da nossa opinião pública e, por esta, para o aumento de prosperidade, que a nossa terra merece e anseia”. Não por acaso, o primeiro artigo publicado na nova Revista respondia a esta pergunta: “Convirá a Guimarães organizar uma exposição industrial?”. O seu autor, Alberto Sampaio, respondeu assim:
“Uma exposição em Guimarães não só é conveniente, mas impõe-se como uma necessidade, se a considerarmos como o primeiro passo para o rejuvenescimento e aperfeiçoamento tanto das suas antigas indústrias como das que têm sido introduzidas nestes últimos quarenta anos.”
E assim se fez, em 1884, a grande exposição industrial de Guimarães, ideia lançada por Domingos Leite Castro, concretizada por iniciativa e obra da Sociedade Martins Sarmento, que teria em Alberto Sampaio a sua alma mater. Assim se cumpriam os objectivos da Sociedade, que nasceu para fazer pensar e agitar. Porque, como escreveu Sampaio, “fazer pensar é tudo; e a agitação a única alavanca que pode deslocar esse mundo: pois que agitar quer dizer – instruir, ensinar, convencer e acordar”.
Na sequência do sucesso da exposição industrial de Guimarães, cuja abertura ao público, na Casa de Vila Flor, seria saudada pelos silvos do comboio que, na mesma altura, chegava até à estação do Cavalinho, o tecido económico de Guimarães não voltaria a ser o mesmo, com a aceleração do processo de introdução de indústrias modernas, movidas pelas novas fontes de energia.
Ainda nesse ano, e na sequência da Exposição, por pressão da Sociedade Martins Sarmento, secundada por outras instituições vimaranenses, seria criada, a Escola Industrial Francisco de Holanda.
O movimento do progresso era acompanhado por uma imprensa atenta e interventiva, a que nesse ano se juntou um novo título, ainda hoje em publicação, O Comércio de Guimarães.
Em 1884, Guimarães havia em Guimarães grandes movimentações para a erecção de dois dos monumentos mais emblemáticos da cidade: o monumento a Pio IX, que então ficaria concluído, e a estátua de D. Afonso Henriques, que seria inaugurada em 1887. Nesse ano ficou concluída a Basílica de S. Pedro, que hoje domina o Toural.
Aquele foi o ano que viu desaparecer prematuramente o Padre António José Ferreira Caldas, autor daquela que ainda hoje é a melhor monografia de Guimarães. Na mesma altura, nasceu Eduardo de Almeida, um dos mais notáveis escritores que esta terra produziu, cujo nome está indelevelmente ligado ao ressurgimento da Sociedade Martins Sarmento na década de 1920.
Em 2009, passarão 125 anos sobre 1884, ano de viragem, em que em Guimarães aconteceu a modernidade. Para assinalar a efeméride, a Sociedade Martins Sarmento, impulsionadora e protagonista dos acontecimentos mais marcantes que então ocorreram, está a preparar, com outras entidades, um programa comemorativo que se deseja à altura daquilo que vai ser comemorado.
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